Sabe quando a privada entope, e uma descarga faz o vaso vomitar merda?
Sabe o esgoto voltando, o que devia ter ido para o subterrâneo exposto assim, à luz do dia?
Singelas imagens para começar um poema, reconheço.
Talvez exatas para descrever este novo affair: Carlinhos Cachoeira.
Uma cachoeira de merda, transbordante. Um mar de merda, onde somos ameaçados de afogamento.
Parabéns, Carlinhos Cachoeira, a sua imagem faz resumir tudo. A sua cara engomada, o seu terno de luxo, o suor que lhe escorre da testa. É a imagem acabada da nossa falência moral. Da permissividade que faz com que um Tribunal sentencie: três meninas de doze anos que fizeram sexo com um maior. O maior não cometeu nenhum crime. As meninas eram prostitutas mesmo.
Enquanto isso perde-se de vista os milhões. Os milhões negociados impunemente.
Carlinhos Cachoeira, um empresário, como é que dizemos aqui? À margem da lei, digamos, eufemisticamente. Um explorador de negócios ilegais, jogo do bicho, todo mundo sabe, todo mundo vê, mas, e daí? Nada que o impeça de frequentar as melhores rodas, e ter amizades eternas (enquanto a merda não explode) com altos figurões da República.
Aparece nome de Governador, aparece nome de Senador, assessor do planalto, chefe do Ministério Público, sócio de gigantesca empreiteira...
Nada provado pela Justiça, não vamos esquecer.
E lá está Cachoeira, aparecendo num vídeo dando dinheiro vivo pro assessor do homem forte do presidente, deputado federal, ministro da Casa Civil, José Dirceu. Estão lá, negociando uma lei. Recebendo em espécie.
E isto foi há uns nove anos. O que deu? O assessor está por aí, evidentemente. E Cachoeira reaparece em glória, em gravações da polícia. Com ele não tem partido. Está pronto para fazer ótimos negócios com todos.
E é o campeão da moralidade que aparece nas gravações mais grotescas. Falando em celular bloqueado. Recebendo uma geladeira de 80 mil de presente.
Um senador que fala uma frase assim: “Eu não sou mais o Demóstenes.” O que falta agora? Vai tirar uma máscara, vamos descobrir que o tempo todo se tratava do diabólico Dr. Mabuse? Vamos desempenhar um papel num ridículo filme de horror B?
E vemos o advogado das estrelas políticas nos seus grossos casos brabos, correr pra dizer que tem todos os argumentos prontos pra livrar seu cliente da cadeia. “provas todas imprestáveis segundo a jurisprudência do Supremo”...
E, no Pará, uma adolescente é trancada numa cela com estupradores, dias a fio.
Corre solta a ópera bufa. Dinheiro na cueca, mensalão, aquele grande negócio fechado... embriaguez de uísque, vamos comemorar, o negócio dos milhões... uma pirâmide enfiada dentro de cada cabeça, é o fim.
Outra das minhas conversas favoritas do imbroglio, desta vez com o próprio Cachoeira:
um diretor da empreiteira Delta, que em pouco tempo multiplicou seus negócios e faturamentos com o poder público por alguns milhões, e cujo dono se chama Fernando Cavendish, e que é muito amigo do Governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, e que gostam muito de levar as famílias juntos para curtir uns bons dias em Paris:
Quer falar com o chefe, Cachoeira?
Chefe?... O Governador?
Não. O Fernando.
Não é a glória? Obrigado, Cachoeira, por ter vertido merda cada vez que abriu a boca, por nos mostrar tão claramente como funcionamos.
O autor... O autor...
E a Delta tem contratos em 23 estados, mais o Distrito Federal. Além da própria União Federal, é claro. Só com a União, a Delta tinha contratos de 41 milhões, em 2001. Em 2011, já tinha contratos de 884 milhões.
Uma cachoeira de contratos, uma cachoeira de dinheiro.
Parabéns às gravações da polícia, autorizadas pela Justiça, parabéns à imprensa livre, que nos mostra o horror.
Parabéns a quem faz o seu trabalho, e pode curtir um dia de alegria entre amigos.
O resto, divide a cela da menina com estupradores, faz faltar o dinheiro pra merenda e pro hospital.
O resto, são ladrões e estupradores.
http://g1.globo.com/jornal-nacional/ (Jornal Nacional de 14.04.2012)
em:
Gravações mostram que quadrilha de Cachoeira está ligada ao MP de Goiás
e
Carlinhos Cachoeira também teria ligações com executivo da construtora Delta
Nenhum comentário:
Postar um comentário