Um Ponto de Carne e de Sangue
O ser humano é um
ponto de carne e de sangue
Sujeito a todas as leis do universo.
Desperto no meio da noite, ele percebe, no entanto,
Que é um portal para diversos reinos.
Alguns destes reinos são infernais,
Mergulhados no ódio e na guerra.
Não há tréguas, e o fogo arde,
E os sobreviventes devem se reunir no norte,
Para, quem sabe, ser resgatados.
Outros reinos são de paz,
Com paisagens de árvores, regatos, rebanhos
E um templo, e uma casa e uma lareira,
Ao redor da qual se reúne uma família.
E em alguns reinos existem respostas claras,
Em outros reinos elas permanecem obscuras.
Em alguns reinos existem escolhas,
E noutros reinos as escolhas foram suspensas.
E em alguns reinos existe a solidão, noutros reinos,
companhia,
E em alguns reinos a solidão é cura e paz, e a companhia
devora,
Noutros reinos a companhia é que é paz, e a solidão é que
devora.
Num dos reinos eu vi um homem uma mulher à beira de uma
estrada
Com um saco aberto a seus pés, cheio de moedas de ouro,
Que exibiam sorridentes aos muitos viajantes que ali
passavam
Atraindo muitos olhares cobiçosos.
O que eu via, mas aqueles viajantes não viam,
Era que escondidos debaixo daquele ouro havia
Correntes e algemas e chicotes e feitores,
E carrascos com seus instrumentos
De tortura e de morte.
Noutro Reino eu vi outro homem e outra mulher
À beira de outra estrada, muito menos frequentada.
Não ofereciam ouro aos viajantes, mas pão e água,
E só os buscava quem se sentia faminto e sedento e fatigado,
Mas eram desprezados pela maioria.
Eram um casal generoso e acolhedor,
E neles não havia mentiras.
Mas não toleravam as injustiças,
Nem toleravam os mentirosos.
Então eu, este ponto de carne e sangue,
Tão ínfimo no meio da noite tão grandiosa,
Desejei ardentemente pertencer àquele reino,
De gente tão íntegra e generosa.
Eu tão ínfimo na noite grandiosa,
Sujeito a todas as leis do espaço-tempo,
Surpreendi-me ao perceber que também era
Um portal, e uma encruzilhada,
De onde podia seguir para diversos reinos.
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