sábado, 26 de maio de 2012

Cinema e Liberdade






Alguns filmes, lembrados ao acaso, com este tema de liberdade:

Um estranho no ninho – no caldo cultural da era da contestação, este filme feito por um refugiado do “paraíso socialista” (a Tchecoslováquia). Mas aqui ele retrata o inferno totalitário na terra de Tio Sam. Jack Nicholson, este gigante, na atuação de sua vida. Arrepiante.

Rebeldia indomável – A direção de Stuart Rosenberg produz este libelo contra as múltiplas formas de dominação do homem pelo homem. Os personagens, embora tão humanamente delineados, assumem uma proporção mística. A máquina de matar “Homem sem olhos”, o sádico diretor do presídio, e, claro, Paul Newman como um homem crístico. Um filme de soberbas qualidades.

Os Sete Samurais – de Akira Kurosawa. No Japão feudal, uma aventura épica, mas também quase documental, sobre uns camponeses que, premidos pela fome e pela ameaça de extinção, decidem sacudir um jugo de milênios e enfrentar os seus ladrões. Auxiliados por sete honrados samurais.

As Aventuras de Robin Hood – A história arquetípica de um herói resistente ao poder de um tirano usurpador. Até que o poder retorne ao bom príncipe, este herói da selva, este fora-da-lei, irá resistir, impedindo a injustiça, “tirando dos ricos para dar aos pobres”. A energia de Errol Flynn, a direção vigorosa de Michael Curtiz, é a melhor versão deste clássico.

Jesse James – de Henry King, com Tyrone Power e Henry Fonda. Outra história de fora-da-lei, desta vez no far-west americano. A opressão e a arrogância dos ricos e poderosos provocando a reação violenta de quem está farto de receber injustiça. Outra história arquetípica, com seus lances de lealdade e traição, de coragem e de covardia. Completa-se com “A volta de Frank James”, de Fritz Lang.

Pink Floyd – The Wall – o ótimo Alan Parker transpõe esta ópera rock do Pink Floyd (escrita por Roger Waters) para as telas. Uma contundente denúncia das múltiplas formas de opressão humana, desembocando no caos da guerra.

Hair – de novo o diretor Milos Forman (de Um estranho no ninho), neste vivo e vibrante musical.

Woodstock – a força do rock, derrubando muros. Destaque para aquela Força da Natureza, o sr. Jimi Hendrix.

O Processo – de Orson Welles. Este terrível pesadelo de um mundo dominado pela opressão mais absoluta. Um mundo sem redenção, um assassinato terrível ao fim de um absurdo processo. O retrato do homem mais desamparado de liberdade.

Cidadão Kane – de Orson Welles. Porque este filme em si representa a liberdade, pela genialidade do diretor que não se prende a um único estilo de cinema, antes aproveita tudo, do expressionismo ao realismo, com ampla liberdade, para contar sua história, ao mesmo tempo pessoal, ao mesmo tempo universal, de ascensão e queda humanas.

Brazil, o filme – de Terry Giliam segue esta linha distópica de uma absoluta ausência de liberdade. Um Estado futurista, surrealista, e que, como boa ficção científica e surreal, mostra profundas realidades. De notar que o roteiro teve a colaboração do famoso dramaturgo Tom Stoppard, como Milos Forman, vejam só, oriundo da antiga Tchecoslováquia.

O Encouraçado Potemkin, e Outubro – de Sergei Eisenstein. O primeiro com uma narrativa mais realista, o segundo se valendo amplamente de imagens arquetípicas, são ambos os filmes emblemáticos do “cinema da liberdade”. Imprescindíveis.

Spartacus – de Stanley Kubrick. Mostrando a Roma antiga, um episódio histórico, constrói um libelo contra a opressão do homem pelo homem para todos os tempos. Kubrick vai beber na fonte do cinema revolucionário soviético para compor suas empolgantes e impressionantes cenas de afirmação da liberdade. Não esquecer o fantástico roteiro de Dalton Trumbo, este perseguido pelas listas-negras, macartistas, norte-americanas.

A Trilogia da Vida – de Pasolini, compreendendo os filmes: Decameron, Os Contos de Canterbury, e As 1001 Noites. Em que Pasolini aborda, com a ajuda destes clássicos da literatura, o tema do Amor, esta mais livre das criaturas.

Crônica de um amor louco – de Marco Ferreri, transpondo a literatura de Charles Bukowski para as telas, este grande inconformado. Ótima atuação de Ben Gazzara. E com a linda Ornella Muti.


O Caso dos Irmãos Naves – de Luís Sérgio Person. Para pensarmos o que foi o período de ditadura do Estado Novo.

Pra frente Brasil – de Roberto Farias. Para pensarmos o que foi o período da ditadura militar. Ótima atuação de Reginaldo Faria.

O Diabo a Quatro – A anarquia feroz dos Irmãos Marx. O humor selvagem alheio a qualquer compromisso com “vacas sagradas”.



E por falar em humor sem compromisso com “vacas sagradas”, A Vida de Brian – Monty Python:


E por falar em humor, Charles Chaplin. Sempre podemos lembrar de O Grande Ditador:


mas prefiro ainda o Vagabundo dos curtas no início da carreira, sempre feroz na luta por comida e pela vida, uma ferocidade tamanha que se sublimava e se transcendia até o humor do outro lado. Até o humor e a liberdade, um vagabundo com uma estrada à frente. Nada a perder, tudo a ganhar.


Midnight Special - Van Morrison e Leadbelly







Um homem é aquilo que faz


Um homem não é medido por suas circunstâncias. É medido por aquilo que faz.

Esta é a regra básica que os imbecis não compreendem.

Um homem não é definido por ter muitos bens. Epicteto: “você admiraria uma serpente dentro de um copo de ouro?”

Um homem na prisão. Um homem condenado à morte.

Têm a certeza de que ele não é a vítima inocente de uma turba insana, de um poder corrupto, um poder destinado à morte, um poder decadente?

Uma estrela da manhã, filha do orgulho, caída do firmamento?

Quem vai para o melhor caminho, Sócrates condenado à morte, a multidão condenada à vida? “Quem segue melhor destino, se eu, se vós, é segredo para todos, exceto para a divindade.”


***



É isto o homem?

Campos de Auschwitz, gulags da Sibéria, prisões do Sul dos Estados Unidos, presídios hiper-lotados do Brasil.

O homem é aquilo que faz.

Será que a pobre vítima de um destes campos, merecia mesmo aquele destino cruel.

Será que vamos ter o orgulho de afirmar:

“Ele devia mesmo estar ali. Alguma ele fez.”

E como sabemos disso?

Como conhecemos a vida de outro homem, para podermos julgá-la?

Julgamos pela vã certeza de nossos olhos. E nos orgulhamos tanto de termos olhos... “têm olhos mas não podem enxergar”.

Julgamos porque ele anda de helicóptero, ou porque ele está na prisão.

Julgamos, sim. Mas o que sabemos?

“E não é ignorância, a mais vergonhosa das ignorâncias, acreditar saber o que não se sabe?”

Será que ainda podemos pagar o preço de nos enganar, e sacrificar no altar da nossa ignorância
as vidas dos nossos filhos? Sacrificá-las à nossa crueldade, à nossa ambição, à nossa covardia?

Como podem se enganar assim?

Andando de helicóptero, para ir daqui para ali.

Curtindo nos melhores hotéis, com dinheiro que não é seu.

Vendendo sua alma por um jantar caro, ou por qualquer bagatela.

Será que pensou que o preço é só isso?

O que é que vai mostrar, do que fez como homem?

Vai mostrar o poder que teve, ou o dinheiro que roubou, ou o prazer que gozou?

Ou vai mostrar o homem que foi, um homem vendido à corrupção, cúmplice de todas as dores na Terra?


***


“Vão enforcar aquele homem”

“Mas que mal ele terá feito? Terá ele assassinado pessoas em série, terá torturado crianças, terá incendiado um asilo de velhos?”

“Não, imagina. Ele não fez nada disso. Ao contrário. Ele era bom com as crianças. Ele sentiu dolorosamente a perda de sua mãe. Ele era um homem gentil, leal pros amigos, não suportava a arrogância.”

“Mas então, o que terá feito?”

“Entrou em algum choque com alguma das autoridades. Um dos homens que mandam aqui. Reclamou dos malfeitos. Dos malfeitores. Reclamou dos feitores. Incomodou muita gente, sabe como é. Os donos da terra. Os que têm a polícia e o juiz no bolso.”

“Destino cruel.”

“O dele? Ou o dos malfeitores?”



***



Pelos frutos os conhecemos




Ele realizou seu destino humano.

Entre tristezas e alegrias. Entre dores e prazeres. Entre ódio e amor.

Ele realizou seu destino humano.

Em seu caminho não existiu a mentira. Ele nunca foi cruel ao mais pobre. Ele nunca bajulou o mais rico.

Ele realizou seu destino humano.

Em suas mãos não foi encontrada a destruição. Em sua boca não foi encontrada a mentira. Em seu coração não foi encontrado o ódio ao inimigo.

Ele realizou seu destino humano.

No sangue que jorrou pela fronte. No sangue que surgiu em suas costas. No sangue que suou por temor.

Ele realizou seu destino humano.

Morrendo abandonado do Pai. Morrendo sem ter um amigo. Morrendo para a dor de quem o ama.

Ele realizou seu destino humano.

Morrendo como uma criança na Síria. Morrendo como uma criança muçulmana. Morrendo como uma criança.

Ele realizou seu destino humano.



quarta-feira, 23 de maio de 2012

O Sono dos Sonâmbulos




Parece que a vontade geral, ou a vontade da maioria, não anda conseguindo muita coisa, ultimamente...

Um triste fracasso, que nos faz perder a esperança (nossa maior perda).

A vontade geral, que deveria ser a vontade soberana, não tem mandado em nada...

Vejamos: a maioria quer segurança. Quer se ver livre dos roubos. Quer Justiça. Quer Prosperidade. Quer não ter de obedecer a algum Grande Ditador, quer não ter seus direitos políticos roubados, quer Paz para criar os seus filhos. Quer oportunidade.

E o que vemos? Injustiças, as mais flagrantes. Roubo impune, roubo premiado. Vidas desperdiçadas, no atoleiro da miséria, da violência, do descaso, da incompetência... vidas destruídas pela falta de emprego, pela miséria, enquanto outros usufruem o que não lhes cabe. Privilégios, os mais imensos, os mais descarados, para uns poucos. Opressão e miséria sobre massas humanas.

Não adianta querer dourar a pílula: a vontade geral perdeu, foi dominada.

Pelos grupinhos de interesses particulares. Pelos donos do poder, os donos da coisa pública.

Não é o povo, não é a voz da maioria. Isto é o que os grupinhos nos repetem e se esforçam para nos fazer crer. Afinal, é mais fácil dominar aqueles que já estão hipnotizados. Os que dormem o sono dos sonâmbulos.

É triste constatar, e é no Brasil e no mundo.

Perdemos a batalha, perdemos tão fragorosamente que nem nos demos conta de que perdemos.

Aqueles grandes ideais, Republicanos. Igualdade, Liberdade, Fraternidade. Um povo livre e próspero, um povo em paz com seus vizinhos. Até formar um mundo livre e próspero.

Desembocou no amargor de vermos persistir a miséria, e a guerra, e a injustiça, e o roubo.

Países saqueando países, explorando povos.

Uma vergonha que a vontade geral esteja assim, entregando os pontos. Preocupada com um milhão de inutilidades e futilidades com que nos entopem as mentes. Esquecida da necessidade de valores, e de trabalho, e de cultura. Acatando passivamente, quando não se colaborando, com os eternos ditadores.

Até que a dor nos faça acordar, ou o amor, amor pelo próximo, amor de si mesmo.