
Do formidável livro “Por que as nações fracassam”, de Daron Acemoglu e James Robinson:
“ (…) O Egito é
pobre exatamente por vir sendo governado por uma pequena elite que
organizou a sociedade em função de seus próprios interesses, em
detrimento da massa da população. O poder político, estritamente
concentrado, vem sendo usado para gerar riquezas para aqueles que já
a detêm (…)
Países como o Reino
Unido e os Estados Unidos enriqueceram porque seus cidadãos
derrubaram as elites que controlavam o poder e criaram uma sociedade
em que os direitos políticos eram distribuídos de maneira muito
mais ampla, na qual o governo era responsável e tinha de responder
aos cidadãos e onde a grande massa da população tinha condições
de tirar vantagem das oportunidades econômicas.”
A tese do livro:
sociedades dividem-se entre aquelas com instituições inclusivas,
que garantem direitos políticos e econômicos (ambos são
indissoluvelmente ligados), e sociedades extrativas, em que uma elite
concentra poderes, traduzidos em leis (direitos), políticos e
econômicos, vivendo da exploração da maioria destituída de tais
poderes.
Os homens, em cada tipo
de sociedade, respondem aos incentivos institucionais. Não são as
diferenças de culturas, religiões, circunstâncias geográficas...,
que são decisivas para definir o crescimento ou a estagnação
econômica. Mas o fato de as instituições dentro de cada sociedade
garantirem um maior ou menor nível de igualdade de direitos entre a
população.
Sociedades em que a
população está garantida em sua liberdade, em sua segurança, em
sua propriedade, têm incentivos para fazer esforços, inclusive
esforços criativos, inovadores, e para fazer investimentos, de
tempo, dinheiro, trabalho, em prol de um progresso pessoal, mas que
debordará em benefícios para toda a sociedade.
São estas as
sociedades inclusivas.
As outras sociedades,
extrativas, formam a grande maioria das experiências históricas. A
partir do momento em que existe uma organização social, um poder de
dar ordens e ser obedecido, o estabelecimento de leis e polícias e
exércitos, a elite que comanda estes poderes tende a configurar os
subordinados de forma a explorá-los.
“Se eu posso mandar
em você, parece uma boa ideia obrigá-lo a trabalhar para mim.” -
não é difícil entender o porquê de, historicamente, as sociedades
se constituírem, predominantemente, para a exploração do homem
pelo homem. Homem lobo do homem.
Saiu do nível
“caçador-coletor”, em que é mais difícil gerar elites muito
diferenciadas, aumenta a exploração. Sociedades sedentárias são
mais divididas, portanto, mais desiguais, mais hierarquizadas.
Caçadores-coletores
desempenhavam, em maior grau, as mesmas funções. Homens caçavam,
mulheres cozinhavam a caça. Era mais simples, sem dúvida.
Mas não é apropriado,
ao menos não é útil, fazer julgamentos morais das mudanças de
paradigma humano; ficar saudoso, idealizar o passado... Não dá para
virar do avesso a História, mudar a marcha do tempo, voltar a ser
caçador-coletor... O que dá pra fazer é lutar por igualdade de
direitos, dentro das sociedades que surgiram, das realidades com que
lidamos.
Com sociedades
sedentárias, alguns foram cuidar da terra; outros foram fabricar
instrumentos; outros foram construir canais, planejar as construções,
julgar as disputas de terras, organizar os celeiros, fazer os
registros de nascimentos, e uma longa lista de etcs.
De repente, uns
mandavam muito mais. E tinham muito mais condições de abusar dos
poderes.
Em breve teríamos
milhões de escravos carregando pedras pra construir os túmulos dos
governantes, alçados à condição divina. Poder de vida e de morte
sobre os homens.
Mas, aqui e ali, foram
surgindo variações deste roteiro. Sociedades organizadas a partir
de famílias que cuidavam de suas próprias terras, que lutavam suas
próprias guerras, que se juntavam pra construir um barco e fazer
suas piratarias ou suas rotas de comércio.
Estes homens podiam
chegar a constituir seus reis, podiam também, esporadicamente,
sofrer nas mãos de alguns tiranos e imperadores. Mas já não era
tão fácil dominá-los, eles iriam opor resistência aos que
ameaçassem suas liberdades.
Estou pensando nos
judeus, estou pensando nos romanos, estou pensando nos gregos
daqueles antigos tempos. Eram as sociedades inclusivas da época.
Carregavam viva a chama da liberdade.
Claro, com os olhos de
hoje, diríamos que é um contra-senso reconhecer nestes povos
respeito à liberdade, quando todos eles mantinham seus escravos.
Mas devemos julgar cada
sociedade pelo padrão de seu próprio tempo. É evidente a diferença
entre as 12 tribos de Israel, a democracia ateniense, a república
romana, e os impérios do Egito, da Pérsia, da Babilônia, da
Assíria...
Por gloriosas que
fossem as realizações humanas sob tais impérios, não se vai dizer
que aqueles povos gozavam de qualquer grau de liberdade e autonomia
comparável aos judeus, gregos e romanos. E, coisa incrível, a
eficiência destes pequenos povos, para forjar novas ideias, para
lutar, para ganhar dinheiro, era tão grande, que conseguiam resistir
e, não raro, prevalecer, contra forças muitas vezes maior.
Fruto das instituições
inclusivas. Um grego, ao invés de ser obrigado a carregar pedras
para o túmulo do Faraó, podia se juntar com alguns amigos e
construir um navio, organizar uma expedição.
Podia organizar uma
Academia de pensamento.
Tinham também seus
governantes, mas entendiam que os governantes tinham de obedecer a
certos limites. Não eram seres divinos, com poderes absolutos.
Em Atenas, aliás, todo
cidadão tinha direito de propor e votar leis, mas ficava, por um
ano, sujeito a processo, multa, prisão, degredo ou morte, o autor de
proposição aprovada, se ulteriormente se verificasse contrária às
leis da cidade, ou perigosa para a República.
Isto é que é
responsabilizar o governante! Se algo do gênero fosse adotado por
aqui, seria um absurdo, por certo, mas certamente seríamos poupados
de muitas outras leis absurdas...
Quanto aos romanos, o
mito fundador de sua República é a derrubada do Rei, Tarquínio, o
Soberbo, depois que seu filho violou Lucrécia, esposa de um
patrício. Refundaram seu poder político sob o signo da igualdade,
em que os direitos de todos deviam ser respeitados por todos. Não
mais aturar a soberba e os desmandos de alguém que se coloca acima
de seus pares.
Durou até o Império,
mas isto já é outra história...
Já para os judeus, o
próprio Deus se vinculava em Aliança, a berith,
espécie de pacto, ou contrato, em que se prevêem direitos e
deveres, como aquela firmada com Abraão (Gn, 17, 1-16). E o próprio
Deus poderia ser questionado por Abraão: “Não fará justiça o
juiz de toda a terra?” (Gn, 18, 25).
Se
o próprio Deus estava obrigado, era limitado nos termos da Aliança,
muito mais os monarcas. O Deuteronômio, 17, 14-20, prevê uma “Lei
do rei”, para o caso da nação dizer: “gostaria de ter um rei,
como o têm todas as nações que me cercam”.
Então,
segundo o Deuteronômio, “escolherás um dos teus irmãos para
rei”, que deverá seguir as prescrições divinas, “para que se
prolonguem os dias de seu reinado, e do reinado de seus filhos no
meio de Israel.”
“Assim
não se levantará orgulhoso acima de seus irmãos”.
Ainda
que autorizada, a instituição de um monarca é vista com reserva no
texto bíblico: “Assim fala o Senhor Deus de Israel: 'Eu tirei
Israel do Egito e vos libertei da mão dos egípcios e de todos os
reinos que vos oprimiam'. E vós rejeitastes hoje a Deus que vos
salvou de todas as calamidades e angústias e dissestes: 'Não
importa! É um rei que deves estabelecer sobre nós!'” (1 Sm, 10,
18-19).
E,
em 1 Sm, 8, 7-22, temos este interessante relato, que mostra com
clareza os efeitos de diminuição da liberdade do povo ante o
advento da monarquia:
“E
disse o Senhor a Samuel: Ouve a voz do povo em tudo quanto te dizem,
pois não te têm rejeitado a ti, antes a mim me têm rejeitado, para
eu não reinar sobre eles.
Conforme a todas as obras que fizeram desde o dia em que os tirei do Egito até ao dia de hoje, a mim me deixaram, e a outros deuses serviram, assim também fazem a ti.
Agora, pois, ouve à sua voz, porém adverte-os solenemente, e declara-lhes qual será o costume do rei que houver de reinar sobre eles.
E falou Samuel todas as palavras do Senhor ao povo, que lhe pedia um rei.
E disse: Este será o costume do rei que houver de reinar sobre vós; ele tomará os vossos filhos, e os empregará nos seus carros, e como seus cavaleiros, para que corram adiante dos seus carros.
E os porá por chefes de mil, e de cinqüenta; e para que lavrem a sua lavoura, e façam a sua sega, e fabriquem as suas armas de guerra e os petrechos de seus carros.
E tomará as vossas filhas para perfumistas, cozinheiras e padeiras.
E tomará o melhor das vossas terras, e das vossas vinhas, e dos vossos olivais, e os dará aos seus servos.
E as vossas sementes, e as vossas vinhas dizimará, para dar aos seus oficiais, e aos seus servos.
Também os vossos servos, e as vossas servas, e os vossos melhores moços, e os vossos jumentos tomará, e os empregará no seu trabalho.
Dizimará o vosso rebanho, e vós lhe servireis de servos.
Então naquele dia clamareis por causa do vosso rei, que vós houverdes escolhido; mas o Senhor não vos ouvirá naquele dia.
Porém o povo não quis ouvir a voz de Samuel; e disseram: “Não importa! Contanto que haja sobre nós um rei!
E nós também seremos como todas as outras nações; e o nosso rei nos julgará, e sairá adiante de nós, e fará as nossas guerras”.
Ouvindo, pois, Samuel todas as palavras do povo, as repetiu aos ouvidos do Senhor.
Então o Senhor disse a Samuel: “Dá ouvidos à sua voz, e constitui-lhes rei”. Então Samuel disse aos homens de Israel: Volte cada um à sua cidade.”
Conforme a todas as obras que fizeram desde o dia em que os tirei do Egito até ao dia de hoje, a mim me deixaram, e a outros deuses serviram, assim também fazem a ti.
Agora, pois, ouve à sua voz, porém adverte-os solenemente, e declara-lhes qual será o costume do rei que houver de reinar sobre eles.
E falou Samuel todas as palavras do Senhor ao povo, que lhe pedia um rei.
E disse: Este será o costume do rei que houver de reinar sobre vós; ele tomará os vossos filhos, e os empregará nos seus carros, e como seus cavaleiros, para que corram adiante dos seus carros.
E os porá por chefes de mil, e de cinqüenta; e para que lavrem a sua lavoura, e façam a sua sega, e fabriquem as suas armas de guerra e os petrechos de seus carros.
E tomará as vossas filhas para perfumistas, cozinheiras e padeiras.
E tomará o melhor das vossas terras, e das vossas vinhas, e dos vossos olivais, e os dará aos seus servos.
E as vossas sementes, e as vossas vinhas dizimará, para dar aos seus oficiais, e aos seus servos.
Também os vossos servos, e as vossas servas, e os vossos melhores moços, e os vossos jumentos tomará, e os empregará no seu trabalho.
Dizimará o vosso rebanho, e vós lhe servireis de servos.
Então naquele dia clamareis por causa do vosso rei, que vós houverdes escolhido; mas o Senhor não vos ouvirá naquele dia.
Porém o povo não quis ouvir a voz de Samuel; e disseram: “Não importa! Contanto que haja sobre nós um rei!
E nós também seremos como todas as outras nações; e o nosso rei nos julgará, e sairá adiante de nós, e fará as nossas guerras”.
Ouvindo, pois, Samuel todas as palavras do povo, as repetiu aos ouvidos do Senhor.
Então o Senhor disse a Samuel: “Dá ouvidos à sua voz, e constitui-lhes rei”. Então Samuel disse aos homens de Israel: Volte cada um à sua cidade.”
Vox
populi
se sobrepondo à própria vox
Dei...
talvez, para que se possa aprender, deva ser permitido o erro...
Advertido o povo foi, de que teria diminuída sua liberdade. Mas,
ainda que podendo muito, o rei não podia tudo... o maior deles,
Davi, foi assim repreendido pelo profeta Natã:
“Por
que desprezaste a palavra do Senhor, fazendo o que lhe desagrada?
Feriste à espada o hitita Urias para casar com sua mulher. Mataste-o
pela espada dos amonitas! Por isso a espada jamais se afastará de
tua casa (...)” (2, Sm 12, 9-10)
Bem,
comecei com Economia, vim parar na Bíblia...
Enfim, limites aos governantes, mais igualdade, resultam em melhores resultados econômicos, maior bem estar para a sociedade...
Enfim, limites aos governantes, mais igualdade, resultam em melhores resultados econômicos, maior bem estar para a sociedade...
Então,
não nos deixemos enganar:
Reforma
política já!
Igualdade
já!
Um
voto de um brasileiro precisa valer o mesmo que outro voto de um
brasileiro!
Voto
distrital simples já!
Liberdade
já!
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