quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Então é isso?




Ficamos assim, então. Erenice Guerra, a Ministra da Casa Civil, “coração do Governo”, como definiu o próprio Presidente da República, “aparelha” o Estado com diversos parentes e chegados em cargos de confiança: um irmão na Infraero, depois na Controladoria Geral da União, o filho na Agência Nacional de Aviação Civil, uma irmã no Ministério do Planejamento, a ex-cunhada na Secretaria do Patrimônio da União, outro irmão no Ministério das Cidades, um amigo de seu filho na Casa Civil... ufa!

Além de tudo isso, lemos no jornal O Globo de 14.09.2010 que Erenice pressionou para que o comando dos Correios fosse trocado, e indicou presidente e o diretor de operações daquela estatal.

Daí então, ficamos sabendo das vantagens de se ter tanta gente conhecida, amiga, tomando decisões que envolvem contratos com órgãos públicos. O filho de Erenice foi acusado pela Revista Veja de ter conseguido um contrato para uma empresa de transportes com os Correios, mesmo não possuindo a tal empresa os requisitos para assumir o contrato. Um contrato de 84 milhões, e o filho de Erenice embolsaria 5 milhões, era sua “taxa de sucesso”. Que serviria também para o pagamento de “compromissos políticos”, conforme justificativa do filho de Erenice.

Mas não ficou por aí. Aparecem novas denúncias, de um empresário que afirma que intermediava com o mesmo filho de Erenice, Israel Guerra, um empréstimo de 9 bilhões no BNDES. De novo, haveria a tal “taxa de sucesso”, padronizada em 5% da grana, no caso, 450 milhões arredondados, que também serviria para pagar uma dívida de uma tal de “dama de ferro”. Oh, que mistério...

E claro que Erenice não cumpria seu dever de servidora pública, de prestar informações de sua renda, e de parentes que tivesse na Administração Pública. Deixou de apresentar os seus dados, embora a Comissão de Ética a cobrasse, reiteradas vezes, sem resposta. Ficou por isso mesmo, até que o caso viesse a público, quando então a Comissão de Ética se resolveu a tomar uma providência: Erenice foi punida com uma “censura ética”, seja lá o que for isso. E ficamos por isso mesmo.

Com tudo isso acontecendo, e só sabemos daquilo que vaza pra imprensa, a pontinha do iceberg, Erenice foi se reunir com outros altos figurões, para organizar sua linha de defesa. Erenice veio a público, para ler uma acusação contra a oposição. Erenice, tadinha, se diz a vítima de uma “sórdida campanha”, e acusou o adversário político de ser “aético e já derrotado”. Agora, o chefão de todos, o presidente Lula, segue a mesma linha: em comício com sua candidata, em Juiz de Fora, discursa:

" - Estou sabendo que tem gente nervosa, e não somos nós que estamos aqui. Levanta a mão para eu ver se tem alguém tremendo aqui. Não tem ninguém. Do lado de lá, se mandar levantar a mão, tem gente que vai perder os dedos de tanta tremedeira. Eles estão com raiva, não acreditaram que eu ia ganhar em 2002. depois, acreditavam que não ia dar certo, e deu tão certo que até eles colocam minha cara no programa da TV como se fossem meus amigos."

Que interessante, não? Tudo se resolve sempre, exclusivamente, na campanha... fazem acusações de corrupção pesada, roubo de milhões, desvio de finalidade do poder público, desequilíbrio da disputa eleitoral, ameaças à própria democracia. Mas a resposta que se dá é um ataque aos adversários políticos. É o clima de guerra, de vale tudo instaurado. É nós contra eles, até a morte. Temos de extirpar opositores, como declarou recentemente nosso presidente, secundado por sua candidata.

E depois Lula diz que “eles” estão com raiva. É sempre “eles”, não é, presidente, nunca somos “nós”. O inferno são os outros, não é, presidente? O problema nunca é com os parentes que nomeamos, com os nossos milhões que não se explicam, com o nosso descumprimento das leis...

O discurso de nosso presidente nos diz mais. Ele pensa que há uma conspiração contra ele. É o outro lado do delírio megalomaníaco. Por um lado, sente-se imbatível, 80% de popularidade! Eu cheguei lá! EU CHEGUEI LÁ! EU... CHEGUEI... LÁ... EU... EU... EU...

Por outro lado, aqueles 20% estão contra mim... Eles me odeiam... eles odeiam o meu sucesso... Eles querem me destruir... A MIM... A MIM... A MIM...

E então é o vale tudo. E então é a guerra. Você não está do meu lado? Então você é bom. Se rouba, é pra mim. Se nomeia parentes, eu vou me favorecer. Vale tudo, nós temos de EXTIRPAR, ESTÁ OUVINDO, EXTIRPAR, O ADVERSÁRIO! SÃO ELES, OU SOMOS NÓS!

Não, não é democrático. Não é sequer civilizado. Onde é o final da ditadura? Nas prisões, nas masmorras, nas torturas, nos desaparecimentos, nos assassinatos em série? Na censura da imprensa, na cassação de políticos? Na uniformização do pensamento, na proibição da liberdade de pensar, de criticar, de se manifestar?

Lá vai o Brasil / Descendo a ladeira... Para onde estamos indo? Aonde podemos chegar? É Cuba o modelo? É União Soviética? É Venezuela? É China? É o próprio Brasil, de 1964, de 1937?

Pode corrupção? Pode aparelhamento? Vale tudo, se for pelo Partido, tudo para se perpetuar no poder?

Não é democrático, não é republicano, mas quem sabe, na massa de analfabetos, o que significa republicano? Quem sabe o que significa democracia? Mesmo nossos universitários, nossa elite intelectual, pouco lê, contenta-se em repetir velhos chavões gastos de dois séculos, é cômodo, dispensa de pensar por conta própria...

Imagino as velhas “justificativas ideológicas”, para os mais letrados: “NÓS SOMOS O GOVERNO DO POVO”; “NÓS PRECISAMOS DEFENDER O POVO DA SANHA DO CAPITALISMO NEO-LIBERAL IMPERIALISTA IANQUE”; “NÓS FAREMOS RESSURGIR A CHAMA DO SOCIALISMO, ESSA IDÉIA TÃO ELEVADA, TÃO PURA”; “NÓS SOMOS AS PESSOAS LINDAS, OS ILUMINADOS DESTE MUNDO”; “NÓS MERECEMOS ESTE PODER, HOJE E PARA TODO O SEMPRE, NOSSOS INIMIGOS SÃO O MAL, QUEREM VENDER ESTE PAÍS, SÃO OS INIMIGOS DO POVO”; “ESSA PREOCUPAÇÃO COM MORALIDADE É PEQUENO-BURGUESA, É DEMODÉ, É NEURÓTICA”.

Para a distinta platéia, atiram-se alguns ossos: diz-se que vai haver investigação, “doa a quem doer”. “A fundo”. Mas isto já havia sido dito, quando estourou o caso dos “aloprados”, quatro anos atrás. 1,7 milhão em dinheiro vivo, em cima de uma mesa, para pagar dossiê contra adversário político, prisões em flagrante de membros da campanha eleitoral do petista Aloísio Mercadante para o Governo de São Paulo. E o que deu? Parentes dos aloprados continuam com bons empreguinhos na Administração; aloprados foram readmitidos no partido; foram readmitidos em cargos públicos, foram apanhados em outra fraude; e não se ouve falar de qualquer punição...

Ou então se repete que: “se errar, tem de pagar”. As acusações são de crimes envolvendo, literalmente, centenas de milhões. Bilhões, para ser mais exato. Crimes contra a democracia. Mas o máximo que se admite falar é em “erros”. Talvez porque “crime”, só quando a Justiça brasileira tiver dado uma decisão de que não caibam recursos. Uma decisão de última instância, ou com trânsito em julgado. Só que certos crimes no Brasil não transitam nunca em julgado. Um assassino de uma mulher, com três tiros de revólver, por motivo torpe, confesso, fica por dez anos em liberdade (e continua contando...), esperando a tal decisão transitada em julgado... e é tudo normal, é tudo assim mesmo, é meu Brasil, brasileiro, e não seja ingênuo...

Ou então o caso prescreve, e a Justiça manda arquivar, sem julgar o mérito. É o que diz a Revista Veja a respeito de Joaquim Roriz, Maluf, dentre outros políticos, numa reportagem sobre crimes prescritos, em 28.07.2010:

“O ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz, hoje no PSC, foi denunciado à Justiça em 2003 sob a acusação de ter comprado remédios sem licitação, por preços altíssimos. O caso só foi analisado em primeira instância há duas semanas, mas já estava prescrito. Por isso, foi arquivado”

A reportagem completa, de Laura Diniz, pode ser lida neste link, STJ na mídia (sim, sim, a Justiça monitora sua imagem na mídia):

http://www.google.com.br/url?sa=t&source=web&cd=4&ved=0CCAQFjAD&url=http%3A%2F%2Fwww.stj.myclipp.inf.br%2Fdefault.asp%3Fsmenu%3Dnoticias%26dtlh%3D146516%26iABA%3DNot%25EDcias%26exp%3D&ei=z2mVTJv7OMP-8AaIwJWNDA&usg=AFQjCNHdO3pwvJ5oIS-kwyoziFyp5BJW3Q

Vocês repararam bem? A acusação é de compra de remédios superfaturados. REMÉDIOS, ENTENDEU? ROUBO DE DINHEIRO PÚBLICO, PREJUÍZO DA SAÚDE PÚBLICA, PREJUÍZO DA VIDA DE BRASILEIROS.

Mas sinto muito, prescreveu, a Justiça se abstém de julgar. Não, não pode investigar, não se pode punir. Prescreveu, já era. É coisa técnica, não é para uns leigos opinarem, mesmo. Pode ter havido um crime contra a Saúde Pública, um agente público envolvido, mas já não interessa. Já tem o que, sete anos? Pois é, sinto muito, mas não deu tempo de analisar isso, não deu tempo de analisar outro desvio de alguns milhões, é isso. Segue a vida. Morreu. Não se fala mais nisso. É carnaval / é folia / neste dia / ninguém chora...

Um último aspecto que gostaria de destacar no pronunciamento do Lula: a parte em que ele debocha dos adversários colocarem a sua cara no programa eleitoral, como se eles fossem seus amigos. E neste ponto eu tenho de concordar com O Cara. Que papel ridículo desempenhava Serra, antes da disputa eleitoral começar, posando para fotos ao lado de Lula e de Dilma! Que espécie de oposição é essa? Consideravam O Cara tão imbatível, que não se atreviam a fazer-lhe críticas? Pois agora engulam mais essa!

Melhor seria se tivessem se atido a princípios. Que honestidade possui uma oposição a favor? Uma oposição que abdica do direito de se opor, do direito de criticar? Desempenhassem seu papel com honestidade, e ainda que perdessem, não pagariam esse mico... esse gorila, esse King Kong...

Do jeito que tá tá bom. Com esse Governo, com essa Oposição...

Mas o brasileiro é um forte, e não desiste nunca!

É isso, por hoje...

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