quinta-feira, 27 de setembro de 2012

A triste face da destruição

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/1a/The_Triumph_of_Death%2C_or_The_Three_Fates.jpg


Uma mulher bomba se explode, matando mais 14. Um embaixador americano é assassinado, com mais três, dentro da sua embaixada.

Valerá a pena pensar sobre isto? Cuidar do seu jardim, só isso? Fugir da responsabilidade que a consciência traz embutida?

Lamentar que os fatos são assim, a triste condição do homem. Pobre espécie, equilibrada entre a glória e a miséria, sem saber de que lado vai pender o destino.

Ter uma vida, qualquer vida, faz de alguém menos que um homem. Um ser e um destino, a ser conhecido depois de sua morte.

Pois até a morte, glorificar, como o louco Rei Creso, sua boa sorte é tentar as Parcas que tecem o destino.

Cada orgulho que traz a sua queda. Cada desmedida do ser humano.

Durante a guerra não há bandidos e não há mocinhos. E o único inocente pagou com sua vida.

Durante a guerra só existem vítimas. Cada um, e ninguém a menos, vítima de seu destino.

Cada um tendo de carregar tudo o que significa ser um guerreiro conquistador, ou ser assassinado pelo irmão pra perder seu trono.

Neste mundo de vítimas, a única mensagem Redentora é a da caridade e da paz.

A paz segundo uma lei, uma lei de comum acordo.

E o primeiro, e na verdade único, mandamento seria o de respeitar e honrar seu próximo.

Mas, durante a guerra, a visão pode ser obnubilada pelo sangue, e pelo fogo, e pela fumaça. Pelo clamor do choro e do ranger de dentes. A morte sofrida numa trincheira da primeira guerra.

Mas a memória persiste, a memória de um menino que fui, e que precisa se fazer criança para ser novamente.

E é por este lado que ressurge a Esperança. Senhora de braceletes de prata no pulso, flores em suas mãos. Para me acolher como Mãe, me acolher como filho. Uma chama para uma hora de trevas.

E nisto se faz o sonhar. Nisto se faz, meu Deus, inclusive o viver!


O juiz Siro Darlan comparecia bastante nos noticiários quando era titular da Vara de Infância e Juventude, por decisões polêmicas proibindo crianças de participarem de novelas e shows.

Andava meio sumido (não que eu estivesse reclamando...), mas agora, promovido a desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (ui) reapareceu em grande estilo, mandando soltar sete de nove dos bandidos que há cerca de dois anos protagonizaram uma cenas de cinema (filme-catástrofe): invadiram o Hotel Intercontinental de São Conrado, fazendo reféns 35 pessoas. Não satisfeitos, trocaram tiros com a polícia em plena rua, armados que estavam com fuzis, pistolas, granadas, grande quantidade de munição, coletes à prova de balas, rádios de comunicação...

Estavam preparados para iniciar, e realmente iniciaram, uma pequena guerra.

Pois nada disso considerou Siro Darlan. Viu apenas que estava estourado o prazo para conclusão do processo. E, daí, ao invés de determinar a rápida conclusão do processo, determinou a soltura dos acusados.

Parece lógico? Parece normal? Quem quiser ler as justificativas de Siro Darlan vai encontrá-las no seu blog: http://www.blogdosirodarlan.com/?p=304

Ele inclusive informa que o Ministério Público considerou muito lógica e normal a decisão: “O Ministério Público, coerente com seu papel fiscalizador, acatou a decisão da Justiça e sequer recorreu da correta decisão, que além da adesão dos procuradores, teve a seu favor o fato de os réus, estando em liberdade, estarem cumprindo as condições legais trabalhando e comparecendo a todos os atos processuais”.

Também o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro preferiu lavar suas mãos, informando em nota que “não interfere nas decisões dos juízes, que são soberanas”, e que, “cabe ao magistrado decidir com a lei e o bom senso”.

Engraçado invocar o bom senso, neste contexto. Será que é bom senso liberar pessoas que notoriamente, e em grau máximo, ameaçaram a sociedade, juntando-se em quadrilha para enfrentar com armamento pesado as forças de segurança?

Será que a sociedade pode aceitar este acinte, ser estapeada na cara, sem reagir, porque se invocam, especiosamente, os direitos humanos?

Direitos humanos, sim, de haver um processo, de haver uma defesa. Mas convivendo com o dever de cumprir pena, caso afronte as leis da sociedade. Maior a afronta, maior é a pena.

Direitos humanos, sim, de cumprir a pena em uma prisão onde seja possível viver. De poder trabalhar para se ressocializar, e também para pagar pelos prejuízos que causou. De ter uma oportunidade para reiniciar a vida, mas agora sob especial controle e vigilância do Estado, em razão do crime cometido.

Enfim, como vale mais uma imagem do que mil palavras:


Termino com este interessante link que descobri enquanto pesquisava sobre Siro Darlan na Internet, referente a rolos criminais envolvendo alguns de seus assessores:



domingo, 16 de setembro de 2012

Bob Dylan - It's All Right, Ma (I'm Only Bleeding) - Tradução



Está tudo certo, Mãe (eu só estou sangrando)

Escuridão ao sol do meio dia
Sombras mesmo sobre os nascidos em berço de ouro

A lâmina feita à mão, o balão da criança
Eclipsa ambos o sol e a lua

Para entender, você descobre demasiado cedo
Não faz sentido tentar

Ameaças pontiagudas blefam com escárnio
Comentários suicidas são destroçados

De bocal de ouro o chifre oco do tolo
toca palavras gastas

Provas para alertar:
Ele não está ocupado nascendo

Está ocupado morrendo

A página da tentação voa pela porta pra fora
Você a segue, você se descobre em guerra

Observa cachoeiras de sofrimento rugindo
Sente vontade de lamentar, mas diferente de antes

Você percebe que é só mais uma pessoa
chorando

Então não tema
se notar

um som estranho
no ouvido

Está tudo certo, mãe,
Eu estou só suspirando...

Como alguma vitória quente,
alguma queda livre

Motivos particulares, pequenos ou grandes
Podem ser vistos nos olhos daqueles que convocam

Pra fazer rastejar os que deviam ser assassinados
Enquanto outros dizem não odeiem nada que seja

À exceção do ódio

Palavras desiludidas, latindo como balas
Enquanto deuses humanos miram nos seus alvos

Fizeram de tudo, de armas de brinquedo que soltam faísca
Até Cristos cor de carne que brilham no escuro

É fácil perceber, sem precisar olhar muito longe
Que não muito é verdadeiramente sagrado

Enquanto pregadores pregam os destinos cruéis
Professores ensinam que o conhecimento espera

Pode conduzir a jantares de mil dólares
E a bondade se esconde atrás dos seus portões

Mas até mesmo o presidente dos Estados Unidos
Algumas vezes terá de se apresentar despido

E apesar de as regras da estrada
terem sido lançadas

É apenas com os jogos humanos
que você precisa lidar

E está tudo certo, mãe,
Eu consigo fazê-lo

Placas de publicidade que enganam
Fazendo acreditar que você é aquele

que pode fazer o que nunca foi feito
que pode vencer o que nunca foi vencido

Enquanto lá fora a vida segue
toda à sua volta

Você se perde, reaparece
De repente percebe que não tem nada a temer

Sozinho, você permanece
com ninguém por perto

Quando uma voz trêmula e distante,
indistinta

Perturba seus ouvidos sonolentos para escutar
que alguém pensa que eles realmente te conhecem

Uma pergunta nos seus nervos se acende
Mesmo assim você sabe não há resposta que encaixe

pra satisfazer e garantir que você não vá desistir
pra manter na mente, e não esquecer

Que não é a ele, ou a ela, ou a eles, ou a qualquer coisa
que você pertence

Embora os mestres
façam as regras

para os homens sábios
e os tolos

Eu não tenho nada, mãe,
conforme o que viver.

Para aqueles que devem obedecer à autoridade
que eles não respeitam, de nenhum modo,

que despreza seus trabalhos, seus destinos,
fala com inveja dos que são livres

fazem o que eles fazem só para serem
nada mais do que algo em que investiram

Enquanto alguns em princípios batizados
em estritos laços de plataforma partidárias

Em clubes sociais disfarçados com trapos,
do lado de fora podem livremente criticar

não dizem nada exceto a quem idolatrar
e então dizem: “Deus o abençoe”.

Enquanto um que canta com sua língua em fogo
Gargareja no coral da corrida de ratos

Com a forma retorcida pelos alicates da sociedade
não está preocupado em subir para céus mais altos

mas prefere te trazer até o buraco
onde ele se encontra
Mas eu não desejo o mal
e nem quero culpar

a nenhum deles
que vive dentro de um cofre

Mas está tudo certo, mãe,
se eu não puder agradá-lo.

Velhas juízas observam os casais
limitadas em sexo elas ousam

empurrar falsas morais, e insulto e mau olhado
Enquanto dinheiro não pede, ele ordena

Obscenidade, quem realmente se importa
Propaganda, tudo é falso

Enquanto os que defendem o que não podem ver
Com o orgulho de assassinos, e a segurança

Que lhes funde nas mentes de modo amargo
Para estes que pensam que a honestidade da morte

não cairá sobre eles, naturalmente,
A vida às vezes deve ficar solitária

Meus olhos colidem
de frente com tumbas estufadas

Falsos objetivos, eu me arrasto
Sob esta mesquinharia, que joga tão sujo,

caminha pra cima e pra baixo, por dentro algemada
chuta minhas pernas até quebrá-las

e me fazer dizer: “chega, eu tive o bastante
o que mais você pode fazer?”

E se os sonhos no meu pensamento
pudessem ser vistos

eles provavelmente colocariam minha cabeça
numa guilhotina

Mas está tudo certo, mãe,
é a vida, e apenas a vida



It's All Right, Ma (I'm Only Bleeding)

Darkness at the break of noon
Shadows even the silver spoon
The handmade blade, the child's balloon
Eclipses both the sun and moon
To understand you know too soon
There is no sense in trying.

Pointed threats, they bluff with scorn
Suicide remarks are torn
From the fools gold mouthpiece
The hollow horn plays wasted words
Proved to warn
That he not busy being born
Is busy dying.

Temptation's page flies out the door
You follow, find yourself at war
Watch waterfalls of pity roar
You feel to moan but unlike before
You discover
That you'd just be
One more person crying.

So don't fear if you hear
A foreign sound to you ear
It's alright, Ma, I'm only sighing.

As some warn victory, some downfall
Private reasons great or small
Can be seen in the eyes of those that call
To make all that should be killed to crawl
While others say don't hate nothing at all
Except hatred.

Disillusioned words like bullets bark
As human gods aim for their marks
Made everything from toy guns that sparks
To flesh-colored Christs that glow in the dark
It's easy to see without looking too far
That not much
Is really sacred.

While preachers preach of evil fates
Teachers teach that knowledge waits
Can lead to hundred-dollar plates
Goodness hides behind its gates
But even the President of the United States
Sometimes must have
To stand naked.

An' though the rules of the road have been lodged
It's only people's games that you got to dodge
And it's alright, Ma, I can make it.

Advertising signs that con you
Into thinking you're the one
That can do what's never been done
That can win what's never been won
Meantime life outside goes on
All around you.

You loose yourself, you reappear
You suddenly find you got nothing to fear
Alone you stand without nobody near
When a trembling distant voice, unclear
Startles your sleeping ears to hear
That somebody thinks
They really found you.

A question in your nerves is lit
Yet you know there is no answer fit to satisfy
Insure you not to quit
To keep it in your mind and not forget
That it is not he or she or them or it
That you belong to.

Although the masters make the rules
For the wise men and the fools
I got nothing, Ma, to live up to.

For them that must obey authority
That they do not respect in any degree
Who despite their jobs, their destinies
Speak jealously of them that are free
Do what they do just to be
Nothing more than something
They invest in.

While some on principles baptized
To strict party platforms ties
Social clubs in drag disguise
Outsiders they can freely criticize
Tell nothing except who to idolize
And then say God Bless him.

While one who sings with his tongue on fire
Gargles in the rat race choir
Bent out of shape from society's pliers
Cares not to come up any higher
But rather get you down in the hole
That he's in.

But I mean no harm nor put fault
On anyone that lives in a vault
But it's alright, Ma, if I can't please him.

Old lady judges, watch people in pairs
Limited in sex, they dare
To push fake morals, insult and stare
While money doesn't talk, it swears
Obscenity, who really cares
Propaganda, all is phony.

While them that defend what they cannot see
With a killer's pride, security
It blows the minds most bitterly
For them that think death's honesty
Won't fall upon them naturally
Life sometimes
Must get lonely.

My eyes collide head-on with stuffed graveyards
False gods, I scuff
At pettiness which plays so rough
Walk upside-down inside handcuffs
Kick my legs to crash it off
Say okay, I have had enough
What else can you show me ?

And if my thought-dreams could been seen
They'd probably put my head in a guillotine
But it's alright, Ma, it's life, and life only.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Compactuar com o roubo - 2

Existe um outro problema em se compactuar com o roubo:

É aceitar que existam duas classes de seres humanos segundo a lei do Estado.

Existem aqueles que precisam respeitar a lei (comuns).

Existem aqueles que não precisam respeitar a lei (incomuns).

Muito embora a Lei Maior (Constituição Federal) diga que a lei deve ser igual para todos (princípio da igualdade jurídica). Mas é preciso observar a prática, por mais lindas que sejam as palavras da lei. E o que esta mostra?

Então, não adianta estufar o peito para dizer que se é muito “democrático”, “igualitário”, “respeitador das leis”, se, na prática, de qualquer modo se pratica o roubo, se recebe dinheiro cujas origens devem permanecer ocultas.

Seja deputado, juiz, policial, presidente, ministro, senador, líder da Câmara, chefe dos super-chefes, o escambau.

Não é democrático, não é igualitário, não é respeitador das leis.

Pode falar muito bem o francês, ou viver na França, ou visitar Cuba, ou torrar uma montanha de dinheiro em Las Vegas.

É ladrão, roubador, desonesto.

E num Estado verdadeiramente democrata, e digno, estaria na cadeia por seu roubo.

Sobre o mensalão

Gostei deste artigo do João Ubaldo Ribeiro:



Concordo que o momento histórico do Judiciário brasileiro ocorrerá quando houver uma pena de prisão, com grades na janela, para algum figurão desviante de dinheiro público.

Se não ocorrer no julgamento do mensalão, este será histórico por motivo bem diverso, o de que instituímos, com a força de decisão oficial de última instância, que o crime pode ser, sim, muito compensador.

Não que se proclame com todas as letras, aliás, tem um monte de circunlóquios e golpes retóricos.

Mas, sabe como é, o bom entendedor tem de saber ler nas entrelinhas...

Apesar da postura corajosa do Joaquim, apesar da força da veemência do discurso do Celso de Mello, etc., permitir que se continue por aí, usufruindo do bem bom, quem fatura milhões com um golpe, é aceitar ser roubado na cara.

Compactuar com o roubo



A notícia de hoje é que o folclórico Doutor (?) Juquinha, aquele cujo patrimônio familiar passou, nos poucos anos em que foi presidente a estatal responsável por obras ferroviárias cortando o país, de 1 milhão e pouco para mais de 60 milhões, o folclórico Dr. Juquinha, dizia, teve um recurso de seu advogado julgado merecedor, por unanimidade, vejam bem, numa Turma Recursal do Tribunal Regional Federal da 1a Região, de fazer com que todas as provas colhidas contra o Dr. Juquinha e seus familiares, através de interceptação telefônica, autorizada pela Justiça, no curso das investigações levadas a cabo.

O relator desta decisão, juiz Tourinho Neto, descendente de ilustríssimo processualista brasileiro, é conhecido por outras decisões invalidando escutas telefônicas feitas pela Polícia, autorizadas pela Justiça.

Segundo declara o referido juiz, “a interceptação telefônica só pode ser utilizada de modo excepcionalíssimo.”

Grandes palavras, mas ainda assim dá vontade de perguntar: será que um patrimônio crescer, milhares de vezes por cento, num curto espaço de tempo, sem que se dê qualquer explicação razoável, não é motivo relevante para uma investigação? E será que está certo desconsiderar os elementos de prova que esta investigação produz, por qualquer argumentação?

O que significa dizer que alguém recebeu milhões e milhões, sem ter sido por salário, por trabalho, por herança, por jogo de azar.

Significa que esse alguém recebeu o dinheiro sem poder prestar contas. Significa que recebeu dinheiro sujo. Significa que a origem deste dinheiro é o roubo, puro e simples, como no Mandamento, seja este roubo classificado como corrupção, furto, assalto a mão armada, ou o que quiserem.

Tolerar uma situação desta significa que a sociedade tolera o roubo.

Não querer investigar, não querer condenar, significa que compactuamos com o roubo.

Se a sociedade não consegue reagir a isto, das duas uma: ou ela é hipócrita, ao proclamar que preza os valores corretos, e praticar o contrário destes valores.

Ou é impotente para mudar, e então a prática que ocorre é uma imposição dos que têm o poder real. E isto conduz à conclusão de que a sociedade não é livre para seguir sob seus verdadeiros valores.

Nenhuma alternativa agradável, mas eu prefiro a segunda, porque a imposição externa sempre pode ser vencida pela resistência humana.

Mas se existe a aceitação interna de que os princípios e valores não valem nada, no máximo bom disfarce para um desenfreado desejo de poder e cobiça, então a condenação é final.

Para alguns destes, que ativamente contribuem para o roubo de um povo cujas crianças morrem, pelas causas mais miseráveis, a condenação já é final.

Irrecorrível.

Se este sentimento se espraia pela sociedade, nos carguinhos e empreguinhos, nos luxões e luxinhos, nos privilegiozões e privilegiozinhos, então a sociedade é condenada.

Força de resistência, aos que querem mudar.

sábado, 1 de setembro de 2012

Lei de cotas no ensino público


"Um diploma universitário não é necessário para a maioria dos serviços que as pessoas fazem no mundo, enquanto a alfabetização, a aritmética e a capacidade básica de interpretar informação o são absolutamente. (...) O principal efeito do fetichismo americano em relação ao diploma foi fazer o trabalho qualificado pragmático parecer de segunda classe." - Robert Hughes, em Cultura da Reclamação - O Desgaste Americano - ed.Companhia das Letras, 1993

Lei recentemente aprovada pela presidenTA Dilma Rousseff determina que 50% das vagas nas universidades federais fiquem sob reserva de cotas, raciais, de renda, e para alunos da rede pública de ensino médio.

Contratamos, com esmero, um grande problema para o país, do presente e a estender-se pelas gerações futuras.

Dá pra pensar na avalanche de ações que abarrotarão nosso já muito ágil Judiciário, de alunos que se sentirão prejudicados, e com razão, na ocupação das vagas.

Agora, ao invés de um sistema igualitário, com poucas e simples regras, comuns para muitos, teremos um sistema com muitas e complicadas regras, diferentes para cada grupo, ou classe, ou raça (termo horrível e vazio de significado, bem o sei. Mas, no nosso Brasil de hoje, imposto por lei - literalmente) de cidadãos.

Agora, teremos uma regra pro branco, outra regra pro negro, uma regra pro índio, uma regra pro pardo...

Uma regra pro branco de escola pública, uma regra pro negro de escola privada, diferente da regra pro pardo de maior renda, que não será igual à regra pro índio de menor renda...

Deu pra sentir o drama? A confusão, a barafunda, que estamos armando? A Torre de Babel que vamos construindo? E esta é só a ponta do iceberg que, por força de lei, lançamos ao mar, na rota de nosso Brasil-Titanic...

Agora, teremos o espetáculo da disputa jurídica do índio de escola pública, contra o pardo de escola privada, contra o branco de pouca renda, contra o negro de muita renda... quase como se cada um tivesse seu regime jurídico próprio, ao invés de uma lei comum a todos.

Pior serão os chefes de secretaria e de gabinetes, os departamentos jurídicos e reitorias, depois os juízes e os tribunais, decidindo quem é de fato negro ou branco...

Será que teremos de pagar a peritos para avaliarem o grau de “negritude”, ou de “brancura”, ou de “indiez” de um indivíduo?

Será que criaremos, ou importaremos, teorias raciais, como aquela infame norte-americana: “uma gota de sangue negro, e é todo negro”?

E enquanto este tipo de situação monstruosa e infame vai ganhando forma legal entre nós, ninguém enxerga ou enfrenta o verdadeiro o verdadeiro problema, tal como surge em pesquisa recente sobre a educação do país:

65 % dos que terminam o ensino médio não são plenamente alfabetizados.

38 % dos que concluem a faculdade não são plenamente alfabetizados.

Dá pra imaginar situação mais bizarra, ominosa pro nosso futuro?

Nós, que já temos índices elevados de evasão escolar (40 % dos trabalhadores brasileiros não concluíram sequer o ensino fundamental), ainda nos damos ao luxo de entregar nada menos de 65 % dos “felizardos” que conseguem chegar ao final do 2o Grau em situação de semi-analfabetismo.

Após longos anos de ensino (ensino?) conseguem mal e porcamente decifrar um texto bem simples.

E 38 % dos nossos “doutores” estão no mesmo nível...

Quanto desperdício de tempo, de recursos, e, principalmente, tristemente, quanto desperdício de futuros...

Creio que a fértil imaginação de Kafka não produziria um pesadelo tão grotesco, e tão medonho, quanto esta nossa realidade.