segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Tempos Sombrios


Para quem lê os sinais dos tempos, os tempos são sombrios. Fosse em Roma antiga, fosse em uma peça de Shakespeare, as coisas estariam bem claras: uma mulher teria dado à luz um aborto, uma grande serpente teria sido vista enrolada ao redor do templo.


Mulheres teriam pesadelos terríveis, anunciando que perderiam o marido. E alguns fantasmas seriam vistos pelo Reino, clamando por vingança.


Sim, isto é o que prefiguram os tempos, os tempos sombrios. Uma menina se jogou, ou foi jogada, de um apartamento. Os poderosos se agraciam com suas festas, 40 milhões de remédios, enquanto à sua frente os hospitais caem na miséria.


É a manchete de hoje do Globo, este hoje sombrio:


“Infecção hospitalar mata 100 mil por ano no Brasil”


“Segundo estudo, não há controle adequado em 80% dos estabelecimentos”


“Enquanto isso, em Nova Iorque...


Em seu primeiro compromisso oficial nos EUA, a presidente Dilma Rousseff exaltará hoje medidas do Governo na Saúde, como o programa que distribui remédios de graça.”



E, na mesma capa, a notícia bizarra: um jovem universitário, estudante de direito, 24 anos, saído de uma festa à fantasia, às 9 horas da manhã, furta um ônibus, dirige 23 quilômetros, provocando acidentes em série. Deixa uma vítima em estado grave. E agora diz que “estava fora de si”. E reclama de ter sido agredido pelos policiais que o prenderam. E vai posar de coitadinho, como tantos exemplos de afrontas à sociedade.



E o que querem dizer estes sinais dos tempos? Que a impunidade chegou a tal ponto de produzir casos bizarros, casos bizarros em série? Um garotinho arrastado para fora do carro. Uma menina, estuprada e morta, o adolescente que fez isso sendo deixado aí, livre, leve e solto. Uma graninha, pro seu guarda, pro seu promotor, pro seu juiz, e não se fala mais nisso.


É isto um país? É isto um homem?


Vergonha das vergonhas, mas o que nos pedem nossos governantes? Com seguranças, salários vitaminados, trabalho do jeito que se quiser, ou se se quiser. Planos de saúde, tudo de bom e do fino? Pedem que vejamos suas belas obras imponentes, e olhemos para o lado bom das coisas... porque criticar é muito feio, e eu posso te negar um favor, e cuidado onde pisa, e é melhor calar a boca...


O Reino da Impunidade. Um jogador famoso mata três. Aleija outros tantos. Apostando corrida, com seu carrão de luxo, air-bag de fábrica (com o jogador não aconteceu nada). Embriagado. Achata outro carro. Mata três. Aleija outros tantos. Ainda tentou uma manobra sórdida, ofereceu dinheiro ao seu carona para que assumisse a culpa. E o que aconteceu?


Passou 42 horas preso. Não chegou a dois dias. Sequer a carteira perdeu. Tantas razões, sabe como é, tantos recursos. E o nosso Supremo Tribunal Federal, nossa mais alta Corte de Justiça, acabou de nos dizer que acabou o processo, que não existe mais pena.

Pela tabela da nossa Justiça uma vida saiu por 14 horas. E nem vou falar das lesões corporais. Ficou incluído no pacote.



Será que é tão surpreendente, neste estado das coisas, nestes tempos sombrios, que uma menina se mate, e que um adolescente mate, e que um débil mental furte um ônibus, e saia por aí, atropelando pessoas?


Este é o país que estamos construindo, este é o país para o qual nos pedem que “vejamos o lado bom das coisas”?


Ou este é o país da impunidade, o país do poder desenfreado.


O sujeito aparece com dez milhões na conta, do dia para a noite.


“Foi umas consultorias secretas que eu fiz”. E fica por isso mesmo.


A sujeita aparece atochando grana na bolsa. Atocha mais, atocha até o fim.


Fica por isso mesmo.


Pois quem tem o poder, quem tem os 40 milhões de votos ali, no cabresto, o gênio que idealizou tamanha compra de votos, e enfeixou todo o poder, e mostrou o caminho das pedras, para si e para os seus asseclas, ensinou como é que se deixa um país inteiro de joelhos.


Ah, estes jovens idealistas, românticos, quanto bem que não fazem! Claro, com as melhores das intenções... Não, não, eu quero o poder, mas não é pela vontade de potência nietscheana, eu quero o poder é para fazer o bem... para mudar esta sociedade injusta... e quanto bem que não fazem!



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