quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Filosofia Política

Hollis Brown he lived on the outside of town...
- Bob Dylan, in Ballad of Hollis Brown

Lendo “É isto um homem?”, de Primo Levi, sobre os horrores do campo de concentração nazista, parece que a primeira tarefa da Filosofia seria pensar os meios de evitar os horrores, o horror nazista e os horrores que se apresentam sob diferentes formas.

Por quê? Para evitá-los, o que seria, se alcançável, a maior realização humana, aquela que mais honra e glória trariam à nossa pobre espécie, perdida num vale de lágrimas, mas com o divino a espreitar do fundo de horrores.

Como dizia Pascal a respeito do homem, ser intermediário entre dois infinitos, infinito grande, infinito pequeno.

Dois vórtices, duas vertigens, o bestial e o divino, e o pobre homem flutuando entre eles.

O amor mais puro, a abjeção mais indizível.

Entregue a um lado, parece cair no seu oposto!

O delírio da grandeza inspirando massacres de crianças! Organizando Auschwitzes!

E ao mesmo tempo, quanta grandeza, combater para que não haja crianças sofrendo! Combater para que não haja Auschwitzes...

E, se vitoriosos, quanta imensa glória!

E, mesmo que não haja vitórias, existe vitória em simplesmente lutar.

Uma morte na cruz, mas que seja pela causa certa!

Quanto ao resto, o Senhor providenciará.

Mas, quanto opróbrio, quanta baixeza, se se recusa ao combate, se ao menos se tenta...

A filosofia parece perdida, parece vencida, porque perdeu o Ideal; porque não pôde sustentar sua validade e valor, diante dos argumentos do outro lado:

materialismo, riquezas;

a certeza de que a vida é o que vale, ainda que uma vida covarde.

a certeza de que se vender por uns tantos cobres é um ótimo negócio, é tudo que vale.

Conformar-se, é entregar-se.

Silenciar, aceitar.

Deixar que decidam, tristes Auschwitzes, e os novos crucificados.

Saqueados, abusados, despojados de tudo, despojados da vida.

Só não é pior que a situação de quem assentiu a tudo isto.

"Foi assim que morreu Emilia, uma menina de 3 anos, já que aos alemães configurava-se evidente a necessidade histórica de mandar à morte as crianças judias. Emilia, filha do engenheiro Aldo Levi de Milão, era uma criança curiosa, ambiciosa, alegre e inteligente. Durante a viagem, no vagão lotado, seus pais tinham conseguido dar-lhe um banho numa bacia de zinco, em água morna que o degenerado maquinista alemão consentira em tirar da locomotiva que nos arrastava para a morte.

Assim, de repente, à traição, desapareceram nossas mulheres, nossos pais, nossos filhos. Praticamente ninguém teve como se despedir deles. Ainda os vimos um tempo, massa escura no fim da plataforma; logo depois, não vimos mais nada."
 - Primo Levi, in "É isto um homem?"

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