
No artigo de Míriam Leitão no jornal O Globo de 16.02.2011, “Erros Caros” (http://oglobo.globo.com/economia/miriam/posts/2011/02/16/erros-caros-363460.asp ), uma bela crítica às duas maiores obras do Governo: o trem-bala, e a hidrelétrica de Belo Monte. Vão obrar a custo de ouro: R$ 35 bilhões, só para o trem-bala, sendo que “ninguém do setor realmente acredita que ficará nisso”. O artigo questiona sensatamente por que o trem-bala sozinho vai consumir a metade do que será investido no setor de ferrovias nos próximos anos. Isto, num país cuja economia tem uma grande demanda não atendida de ferrovias: temos 28 mil quilômetros, e a Agência Nacional de Transporte Ferroviário estima que precisaríamos, hoje, de 50 mil quilômetros; nem em 2023, se todos os projetos do Governo para o setor saírem do papel, atingiremos este patamar, que representa a necessidade atual.
Uma frase do artigo resume bem a situação: “Confesso não entender por que um país com poucos recursos para investir escolhe dois projetos faraônicos num tempo em que há tanto a fazer”.
E por que o Governo se empenha tanto para fazer passar estes projetos faraônicos? No caso de Belo Monte (de merda), o Governo se empenha para contornar os problemas gerados pela inadimplência no depósito de garantias pela Bertin, empresa que é o grupo-chave do consórcio que ganhou a licitação para construir Belo Monte. Esta Bertin criava boi, e “passou de uma hora para outra ao setor de infraestrutura e assumiu proporções gigantes, empurrada pelas licitações que ganhou para construir termelétricas e rodovias”.
Com relação ao trem-bala o Governo mostra-se igualmente ansioso por empurrar o projeto pra frente, não importando os custos: o Governo torra subsídios como se fossem madeira seca, R$ 20 bilhões de empréstimos do BNDES, com juros camaradas; R$ 5 bilhões de “doação” do Governo, para o caso de o movimento de passageiros não ser o que foi projetado (ah, as glórias do capitalismo sem risco! É só dar um “jeitinho”, à brasileira, e o empresário não perde seu dinheirinho... tem o dinheirinho dos trouxas pra torrar mesmo...). Ainda tem uma estatal a ser criada, a ETAV, Empresa do Trem de Alta Velocidade... mais uma estatal, pra encher de cargos de confiança, pra dar guarida pros companheiros que perderam eleição, etc etc. Pela bagatela de R$ 3,4 bilhões... é bom ser país rico, ter tanto dinheiro pra gastar... pobre passando fome? Ah, sai aí uma bolsa-esmolinha, 100 merrecas, e ele ainda te agradece e, mais importante ainda, te entrega o voto...
E o Governo enfiar uns projetos desses pela garganta do país, torrar essas montanhas de dinheiro, com toda essa pressa, com todo esse afã para contornar os obstáculos, os argumentos, para passar por cima da mais elementar racionalidade, a mais mínima razoabilidade, é a demonstração cristalina de que não Oposição neste país, não temos voz e não temos vez contra a vontade do Rei, por estúpida, caprichosa ou perniciosa que seja. Ah, mas sempre tem uns grupinhos por trás dos projetos, uns grupinhos que ficarão muitíssimo satisfeitos de ver que cai no seu colo R$ 35 bilhõezinhos, e “doações” públicas que eliminam o risco do negócio, e juros camaradas, e outras coisinhas do gênero... para agradar a estes grupinhos, o Rei move mundos e fundos, atropela os argumentos contrários, joga todo o seu peso, joga toda a sua força, e o nosso país, sem tradições de resistir à vontade do Governante, muito envergonhado ou assustado de ser impertinente, inconveniente, indelicado, permite calado que lhe esfolem o couro todo.
Só nos resta mesmo viver na miséria, e desperdiçar as chances de ganhar dinheiro, porque não temos ferrovias suficientes para atender nossa demanda, por exemplo. Ou morrer numa inundação, ou num desabamento, porque o Governo não gastou o dinheiro com os recursos de prevenção, por exemplo. Ah, triste sina deste país!
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