sexta-feira, 9 de julho de 2010

SORDIDEZ

Zapeando pelos noticiários ontem a noite. O caso Bruno, onipresente. E num jornal (da Record?), uma reportagem sobre um posto de gasolina em São Paulo, que este ano já tinha sido assaltado 30 vezes. Nos últimos dois meses, 15. Desta última vez, os criminosos, filmados pela câmera de segurança do posto, tinham sido apanhados. Um dimenor de 17 anos, um dimaior de 21; filmados, atrás das grades, não pareciam muito preocupados. Riam e debochavam para a câmera. O dono do posto explicava que em muitos dos assaltos anteriores sequer fez o boletim de ocorrência. Depois da violência do assalto, era outra violência perder um dia, às vezes uma noite, para fazer um B.O. “Teve uma vez que eu cheguei na delegacia às 2 h. da tarde e fui sair às 5 h. da manhã do dia seguinte; fazer B.O. pra quê?” - perguntava, angustiado. Com os assaltos do ano, contabilizava R$ 15 mil de prejuízo. Mais o medo de ir pro trabalho, quem sabe como pode acabar um desses roubos?

E em meu cérebro fiquei relacionando uma coisa com outra. Os roubos no posto, o sórdido caso Bruno. Afinal, o que leva tantos, neste país, a apostarem no crime? O jogador de futebol, a corja dos que lhe “prestaram serviços”, os bandidos do posto... e tantos assassinos, mensaleiros, estupradores... é a certeza da impunidade? Mas não temos policiais, não temos juízes, não temos promotores?

Temos, sim, tudo isso. Juízes com dois meses de férias por ano (mais recesso), fazendo muitas vezes semanas TQQ (terça-feira, quarta-feira e quinta-feira); promotores com dois meses de férias por ano (mais recesso), fazendo muitas vezes semanas TQQ (terça-feira, quarta-feira e quinta-feira); policiais trabalhando (ou quase isso) em regime de um dia por três de folga; ou três dias por onze de folga. Todos com salários religiosamente pagos em dia, e generosos aumentos acima da inflação. Mas então, como é que esse clima de impunidade e favorecimento se generaliza?

Em outras reportagens do jornal de ontem (da Band?) se relembravam outros casos emblemáticos de violência contra a mulher impunes. Pimenta das Neves, assassino confesso, em liberdade 10 anos após o crime, aguardando julgamento de seus recursos... a cabeleireira que filmou a própria morte, em seu local de trabalho, depois de diversos registros de ocorrência na delegacia das ameaças que seu ex-companheiro lhe fazia. Todos apostando na impunidade, tantos os que ganham a aposta.

O clima de vale tudo é reforçado pelos nossos privilégios na forma da lei, pelos nossos abusos adquiridos. Uma lei do mais forte, do mais esperto, do melhor relacionado. Uma prática de “sabe com quem está falando?”, de favoritismos, de pessoas “incomuns” (não é, Sarney? Não é, presidente Lula?) que não vão em cana. Um país que não é sério.

Lamentam os pais que perdem filhos, os filhos que ficam órfãos, apanhados no redemoinho desta falta de seriedade, deste escárnio cínico, desta corrupção, desta violência que nos assola. Os grandes, “incomuns”, nossos senhores, protegem a si e aos seus, bem direitinho (e no mais das vezes, com o dinheiro dos diletos “contribuintes”). Vivem num outro mundo, um país à parte, uma ilha da fantasia. Para quê leis mais duras, para quê aplicação rigorosa, se o mal só atinge os que estão “lá fora”? E se esse estado das coisas é tão favorável para minhas próprias negociatas? Temos aí o grande conflito de interesses entre a massa dos servos e aqueles que possuem o poder nas mãos.

Como ilustra o caso de dois de nossos ilustres ministros do Supremo Tribunal Federal, que em visita ao Rio de Janeiro passaram pelo dissabor de, atravessando a Linha Vermelha, vindos do aeroporto, ficarem presos num “arrastão” dentro do carro. Nada lhes aconteceu, com vidros blindados e seguranças, mas o susto motivou comentário do Secretário de Segurança (estadual? Municipal? Não estou lembrando os detalhes do caso, nem quero pesquisar na internet. Para os dispostos, tem o Google): “Houve uma falha da segurança. Suas Excelências deveriam ter se valido de um helicóptero para atravessar aquele perigoso trecho”. Pois é. Para os que não têm helicóptero, comam brioche. Com recheio de chumbo grosso.

Assim se constrói uma nação, para nós e para nossos filhos. Assim se constrói o clima de impunidade que multiplica crimes, cada vez mais bárbaros, por motivos cada vez mais fúteis. Mas é melhor não insistir nisso pra não correr o risco de ser visto como um chato, mal-humorado, desmancha-prazeres. Vamos repetir o mantra de marqueteiros oficiais (com contas milionárias em paraísos fiscais, não é, Duda Mendonça?): o brasileiro não desiste nunca! Brasil, um país de todos! O melhor do Brasil é o brasileiro! E haja cachaça! Haja axé music! Segura o tchan-tchan-tchan-tchan-tchan! Sem medo de ser feliz!

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