As Unidades de Polícia Pacificadora foram a grande propaganda do governo de Sérgio Cabral Filho. Ele identificou corretamente que a população estava farta da impunidade de impérios do tráfico, dominando as favelas. Anos e anos de omissão e ineficiência em combater esses feudos, esses Estados dentro do Estado, com outras leis, com outro Juiz, com outro Executor...
Verdadeiras tiranias, praticavam a tortura, a extorsão, impunemente. A Lei era a de suas armas, e da certeza da impunidade, da certeza de que estava pagando sua segurança para as pessoas certas, e da certeza de que o que faria com aquelas pessoas de sua comunidade importaria muito pouco para aqueles de fora. Uma sociedade dividida, uma cidade partida, como no título de um ótimo livro de Zuenir Ventura. Realmente, nós não possuímos um sentimento de verdadeira igualdade entre nós. Ou o favelado é tudo bandido, e não vamos ficar tristes se um deles é morto, ou são uns coitadinhos, que nem precisam respeitar nossas leis, nenhuma lei, porque já sofrem tanto...
Uma e outra atitude revelando esta recusa de nos vermos iguais, uns aos outros. Aqui é: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”; é “sabe com quem tá falando?”. Aqui é a “carteirada”. Aqui o sujeito precisa ultrapassar o outro, mesmo que o local seja proibido, mesmo que seja pela faixa proibida, mesmo que vá provocar um acidente. Porque se você não é o primeiro, você é o segundo. E aqui, o primeiro é o esperto, o segundo é o otário. O primeiro é o senhor, o segundo é o escravo.
Não, não é exatamente um lugar paradisíaco. Mas falava das UPPs.
Dizia que Sergio Cabral Filho as trouxe como uma novidade, uma nova forma de combater o crime, aumentar a segurança. A idéia era ocupar as favelas, antes dominadas pelos bandos de traficantes, e instalar nelas uma divisão das forças de segurança. Um batalhão da polícia militar.
Pode-se dizer que foi uma estratégia de sucesso, até certo ponto. Primeiro, a ocupação foi muito mais simples do que se previa, no início. Houve até uma conversa de “acertos prévios”, entre a polícia e os traficantes, para se evitarem os confrontos. Mas o certo é que quase não houve mesmo confrontos.
Foi bom, porque mostrou que o Diabo não era tão feio quanto se pintava. Aquele papo entreguista, de que o problema era insolucionável, ou de que devíamos aguardar a tal Justiça Social, talvez uma mudança pro regime comunista, para que não houvesse mais crimes, mostrou-se totalmente furado.
Mas mesmo furado, custou por muitos anos o bem estar e a vida de milhões de pessoas que viviam nas comunidades sofrendo o jugo de tiranos.
Mas o outro lado dessa ausência de confronto foi que não se ouviu falar em prisões, com muita frequência. Uma vitória incompleta, portanto.
É verdade que representou uma virada na vida das comunidades, que ficaram muito mais livres, agora. Os índices de homicídios caíram, e os bandidos não se recuperaram fácil do golpe. O foco das UPPs foi acabar com aquela violência mais explícita. Os desfiles de traficantes com metralhadoras e fuzis, as guerras pelos pontos de tráfico.
Esse descalabro mais extremo foi mirado e combatido pela nova política de segurança, e os resultados são louváveis. Aquela violência mais extrema deixou de ser tão fácil, e o crime recuou, felizmente.
Ninguém pensa que acabou com o tráfico, acabou com o consumo de drogas. O que diminuiu muito, como dito, foi a extrapolação do dinheiro do tráfico associada ao desgoverno e impunidades absolutos, que permitia as tiranias e as guerras nos morros, como “fatos da vida”.
Mas os bandidos, ainda soltos, se reorganizam de outras maneiras para prosseguir seus “negócios”. Arrastões foram promovidos em sequência, na última semana. Alguns se mudaram para outras regiões do Estado, menos preparadas para lidar com este nível de bandidagem. Aqui onde escrevo, em Nova Friburgo, acontece isto. Na Região dos Lagos, e outros lugares, também.
Mas por enquanto não se discute isso. Sergio Cabral Filho se reelegeu no primeiro turno, as UPPs passaram então no teste supremo: fazer as urnas darem seus votos. A candidata do PT à presidência, Dilma Rousseff, aliada de Cabral, também pegou sua carona na popularidade das UPPs. Prometeu que as espalharia por todo o país. Claro que as UPPs foram bem sucedidas porque foram pensadas para atender às peculiaridades do Rio de Janeiro, e não tem cabimento falar em “exportar” seu modelo pro resto do Brasil... mas isso é só uma promessa de campanha, palavras ao vento... importante é parecer bem na foto.
Já o Sergio Cabral, já reeleito, está acelerando a implantação de UPPs, e deve-se temer pelo exagero na dosagem do remédio. Ele agora só enxerga os dividendos políticos, e está empolgado. Mas é preciso perguntar se esta política, custosa, vai aprofundar realmente a segurança no Estado. Tem de se pensar também no amanhã.
A UPP tem seus méritos. Mas é preciso pensar no meio de fazer a única coisa capaz de coibir o crime: colocar na cadeia os que cometem os crimes. Só assim eles vão deixar de constituir uma ameaça, ou um gravame, para a sociedade.
domingo, 14 de novembro de 2010
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