terça-feira, 3 de maio de 2011

OSAMA EXECUTADO SEM JULGAMENTO








Nas manchetes de jornal, a sensação: Osama Bin Laden executado, o presidente dos EUA faz o discurso: “Este é um dia bom para os EUA. O mundo está mais seguro. É um um lugar melhor devido à morte de Osama bin Laden”.


Que triste o chefe da nação mais poderosa do mundo saudando a morte de um ser humano como algo que faz o mundo melhor! Melhor para quem, cara-pálida? Melhor talvez para Obama, já vejo manchetes: “Osama morto, Obama reeleito”; e “Aprovação a Obama sobe 9 pontos após a morte de Osama”. Já para Osama, que levou o tiro, o mundo não deve estar muito melhor... para as outras cinco pessoas que estavam com Osama no momento do ataque, um de seus filhos, dois mensageiros, sua esposa, outra mulher, todos mortos, também não.


E ainda precisamos engolir o porta-voz de alguma potência, que admite que Osama estava desarmado no momento da ação. “Mas não é preciso estar armado para reagir”, nos ensina o porta-voz, na maior cara-de-pau. Um Osama desarmado, contra 78 seals treinados, fortemente armados. Mas, claro, eles não conseguiriam dominá-lo, tinham de matá-lo. Assim como as outras cinco pessoas, os seals apenas usaram de legítima defesa... agora conta outra.


Pouca gente para se preocupar com isso... Os justos todos posam na foto com bandeiras, punhos pro ar, cartas ao jornal lembrando as atrocidades que Osama cometeu... podem dormir o seu sono de justos, sentindo-se meio heróis, sentindo-se do lado certo, o lado que recebe aplausos...


Mas... sempre tem um mas...meu coração de advogado, de cidadão que pensa que para haver democracia é preciso haver Tribunais, julgamentos justos, e PRINCIPALMENTE, que seja dada voz a TODAS as pessoas, terroristas ou não terroristas, árabes ou judeus, negros ou brancos...


Por que a nossa “Fúria Santa” sempre elege alguns cidadãos “de segunda classe”, para os quais não precisamos praticar a democracia? Ou você é um democrata ou você é um tirano, tertium non datur. Ou a lei é igual para todos, e todos são merecedores de um julgamento justo, equilibrado, dentro das regras, com a possibilidade de defesa, ou você é um tirano, um orgulhoso, um presunçoso, que sustenta que para alguns (nunca você, sempre o outro), não é preciso julgamento, basta o tiro na cara, ou o tiro na nuca, porque ele já foi condenado, condenado pela propaganda, condenado pela opinião pública.


São os campeões da Justiça, os portadores de todas as certezas. Para que ouvir o outro lado? Ele é bandido mesmo, o bad guy, passa fogo, bandido bom é bandido morto. Eu sou o mocinho, o herói, o cara bonzinho... eu olho pra todos os lados, todos são como eu, todos merecem o aplauso, menos o que ousa questionar... ah, este é um traidor, um amigo de criminosos, um inimigo do povo!


Ainda assim, mantenho o questionamento, amparado na liberdade que temos reconhecida, liberdade de expressão: não é estranho, depois de dez anos de busca, que Osama seja executado em 30 segundos? Osama, e, como eu disse, todas as demais pessoas que estavam com ele, “sem testemunhas”. Ora, uma equipe de elite, numa operação conduzida por helicópteros, planejada com antecedência, será que não tinha condições de capturar vivos os inimigos? Não possuem super-gases, super-anestésicos, super-estratégias?


Talvez pudessem, mas talvez não quisessem trazer ninguém vivo. E aí voltamos ao ponto: a quem aproveita não haver julgamento, a quem aproveita não haver discussão, não haver democracia? Não aos democratas, sim aos tiranos. Aos que pretendem impor a lei do mais forte. Aos que dizem, “não quero argumentos, não quero que me perturbem nas minhas convicções! Sei tudo, conheço tudo, opino tudo, e não preciso considerar qualquer outro lado! Já sei o lado que a propaganda me diz pra ficar, o lado das pessoas justas e lindas, o lado que recebe o aplauso, que conquista a mocinha no fim...”


Para estes, realmente, pra que julgamento, para que ouvir o outro lado? Não querem nada que abale suas certezas, que produza desconforto capaz de abalar os seus lindos sonhos... e quem tem tempo pra questionar alguma coisa, precisamos correr pra pegar o ônibus, e pra dar o sangue no trabalho, precisamos virar um sucesso... ou precisamos correr pra ir pra próxima festa, a quinta desta semana, precisamos aproveitar a vida...


Para estes, o que dizer? Lamentar que o espírito da tirania tenha criado raízes dentro deles, sugerir a leitura dos diálogos platônicos, especialmente daqueles onde aparece a figura de Sócrates, este grande demolidor de certezas. “Tudo o que sei é que nada sei”.


Talvez, se ouvíssemos o lado do outro, pudéssemos descobrir algo em nós mesmos de errado, algo que poderíamos corrigir para talvez, quem sabe, evitar novos ataques terroristas, novas pessoas se tornando terroristas. Ou será que os EUA são o lado da luz e do bem, e os outros são as trevas e o mal? Será que os EUA não têm sua cota de atrocidades, de arrogância, de guerras corruptas, de mortes por dinheiro?


O terrorista pode ser julgado, e pagar por seus crimes, de acordo com as leis do homem. Pode ser condenado, até à pena de morte, embora, pessoalmente, eu seja contra a pena de morte. Mas não pode ser caçado e executado sem julgamento, pois nenhum ser humano pode. Ou então é a lei da força, ou seja, é não haver lei. É ter os soldados, é ter a bomba, e fazer o que bem entende. No máximo, manipulando a opinião pública, através de técnicas de propaganda.


E isto é um poder tirano, um poder ilegítimo, que se apóia na força. E um poder que, inclusive, gera terroristas.


Dois lados da mesma moeda. Afinal, se o terrorista usa a força de modo ilegítimo, como condená-lo, como combatê-lo, como derrotá-lo, se nós próprios justificamos o uso ilegítimo da força? Para eles, vale tudo contra o Grande Satã. E nós? Vamos dizer que Osama é o anti-Cristo, e que vale tudo contra ele?


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